Tributos: Adesão ao programa de parcelamento requer atenção
O programa de parcelamento tributário instituído por meio da Lei 11.941/09 tem gerado dúvidas e polêmicas entre advogados, contadores e empresários.
Luciane Medeiros
O programa de parcelamento tributário instituído por  meio da Lei 11.941/09 tem gerado dúvidas e polêmicas entre advogados, contadores  e empresários. A regulamentação, chamada de novo Refis, permitirá aos  contribuintes com débitos junto à Receita Federal do Brasil (RFB) e à  Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) regularizarem as pendências  fiscais existentes até novembro de 2008. Com ele, será possível quitar também  saldos remanescentes de ações anteriores oferecidos pela União como o Refis,  Paes e Paex e fazer o aproveitamento indevido do IPI alíquota zero, entre outras  medidas. 
Para os especialistas, há um consenso em meio às incertezas: antes  de aderir ao parcelamento, é essencial analisar os benefícios que o contribuinte  terá ou não. "Ao ingressar no programa, o empresário faz uma confissão de  dívida, devendo portanto avaliar as consequências de abrir mão de discussões  judiciais ou desistir de ações onde questiona a validade da cobrança de  determinados tributos." A explicação é do advogado tributarista do escritório  Scalzilli, Ricardo Preis de Freitas Valle Corrêa. Segundo ele, há casos em que a  empresa resolve aderir para pagar determinado débito que poderia ser considerado  judicialmente uma cobrança indevida. 
Rafael Nichele, consultor Tributário do  escritório Cabanellos Schuh Advogados Associados faz um alerta em relação aos  efeitos fiscais futuros das reduções das multas, juros e encargos legais. A lei  estabelece que todas as reduções não serão computadas no cálculo dos tributos  sobre a renda e sobre a receita. Na prática, portanto, o aumento do resultado da  empresa por meio da eliminação do passivo fiscal representado pelas multas não  poderá afetar a base de cálculo dos tributos mencionados. "Aqui novamente o  contribuinte deve estar atento ao texto da regulamentação. O resultado das  consultas feitas perante a Receita Federal antes da lei indica que somente a  multa que tenha sido integralmente paga é dedutível do IRPJ", diz. 
Em meio  às críticas, os pontos positivos das novas regras também merecem espaço. "O  parcelamento veio em boa hora para as empresas que enfrentam dificuldades nessa  época de crise econômica e estão com dificuldades para pagar os tributos  normalmente", diz o contador Ronaldo Silveira. A possibilidade de migrar dos  parcelamentos anteriores para essa versão é elogiada pelos tributaristas, uma  vez que os valores pagos serão aproveitados. As modalidades para quitar a dívida  - à vista, 30, 60, 120 ou 180 vezes - possibilidade de redução de multas e juros  e o fato de não ser necessário arrolar bens de garantia para esse pagamento são  outros pontos considerados favoráveis.
Perdão de multas evidencia  falhas no sistema
A implantação de programas para parcelamentos de  impostos de tempos em tempos é sintoma de um problema mais grave: um sistema  tributário ineficiente. Humberto Ávila, da Advogados Associados, faz o  questinamento. "Quando o governo opta por abrir mão de cobrar juros ou multas, é  sinal de que algo está errado no sistema. Os contribuintes não conseguem pagar  em dia os impostos."
O perdão dado às dívidas e possíveis descontos geram um  efeito negativo. Cria em muitos empresários a mentalidade de que, ao não pagar  hoje, será beneficiado posteriormente pelos programas lançados pelo governo. A  discussão em torno de uma reforma tributária, em voga nos últimos anos, não deve  trazer resultados concretos para resolver esse problema. "Desde os anos 1990  temos debates sobre a realização das mudanças, embora sem seriedade e interesse  concreto e firme no sentido de aprovar as alterações. A reforma tributária  sempre foi um pretexto de um lado para dar satisfação à população e de outro  para aprovar outras questões que não as novas regras", diz Ávila. 
O advogado  faz ainda outras críticas ao novo Refis, na elaboração da lei. O texto prevê a  autorização para transação de débitos muito altos. São valores acima de R$ 500  mil que podem ser transacionados com o poder público sem critérios especificando  como isso será feito. A lei estabelece que determinadas autoridades podem  delegar a outras o poder de fazer uma negociação sobre dívidas. Ávila não vê com  bons olhos essa possibilidade. "O conteúdo preocupa porque não sabemos como será  feito, na prática, com os débitos milionários."
Durante dois anos, foi  discutida a elaboração de uma lei de transação no direito tributário,  estabelecendo critérios e princípios para a realização de tais negociações.  "Agora, com a aprovação da Lei 11.941/09 surge do nada um dispositivo  autorizando as mais altas autoridades a negociar débitos sem especificar  critérios. Pode não ser um dispositivo ruim, depende do fim que será dado a ele,  podendo vir a ser mal aplicado", teme o advogado. 
Planejamento é  essencial
A adesão ao parcelamento deve ser feita com base não só na  análise financeira mas também levando em conta dados estratégicos e de  planejamento. O tributarista Ricardo Preis de Freitas Valle Corrêa diz que a  opção precisa ser feita como parte de um planejamento futuro. "Muitas empresas  ingressam em programas desse tipo como se fosse essa uma saída e acabam não  cumprindo as obrigações, transformando em uma dívida impagável. O efeito é  pior."
O caminho a ser seguido pelos contribuintes em débito é analisar as  obrigações futuras e elaborar um planejamento de crescimento, uma vez que o  caixa da empresa será onerado, implicando a estrutura contábil do negócio. Antes  de optar por algo que pode ser apenas uma saída financeira momentânea, devem-se  analisar questões financeiras, estratégicas e questões como intenção de expandir  os negócios, necessidade de financiamentos e outras. Corrêa cita como exemplo o  caso de uma empresa sem Certidão Negativa de Débito (CND). Para poder participar  de licitações, o documento é necessário. "Essa é uma situação em que ingressar  no novo Refis é uma boa opção, entretanto se o empresário não puder arcar com  esse compromisso o resultado será pior."
A aprovação da Lei 11.941/09 tem  levado vários empresários aos escritórios contábeis e de advocacia na busca por  orientação. O contador Ronaldo Silveira tem recebido solicitações de clientes  interessados em aderir ao novo programa. O trabalho consiste na verificação dos  tributos, relacionando quais podem ser parcelados, valores devidos e a  existência de possíveis multas a pagar. A intenção, diz ele, é reunir todas as  informações necessárias para então aderir ao parcelamento quando for vantajoso.  
Os débitos existentes devidos e não comunicados à Receita Federal e outros  órgãos precisam ser informados, pois só assim será possível fazer o  parcelamento. Quem não entregou a Declaração de Débitos e Créditos Tributários  Federais (DCTF) necessita repassar ao Fisco esses dados.
O prazo para adesão  ao parcelamento termina em 30 de novembro de 2009 e deverá ser regulamentado até  27 de julho deste ano, quando tomaremos conhecimento das regras que a  Administração Federal expedirá para viabilizar a execução das determinações  previstas pela Lei do Parcelamento Ordinário. Por isso, recomenda-se aguardar  este prazo de 60 dias a fim de se proceder a análise das normas a serem  cumpridas e, de forma crítica, preparar-se para as circunstâncias decorrentes,  tudo devidamente planejado.
Taxa Selic definirá atualizações nos  valores dos débitos 
Ao elaborar a legislação regulamentando o  parcelamento de débitos tributários, ficou estabelecido como índice para  atualização dos valores a taxa Selic. "Embora atualmente a Selic venha  apresentando redução, não sabemos como ela estará dentro de alguns anos", lembra  o diretor da BDO Trevisan Ricardo Bonfá. A definição por esse indexador é  considerada por ele o ponto mais desfavorável nas novas regras. 
Outra  novidade da Lei nº 11.941/09 foi a revogação do parágrafo 1º do art. 3º da Lei  9.718/98 que amplia a base de cálculo da Cofins de faturamento para receita,  matéria que foi objeto de diversas ações judiciais por parte dos contribuintes.  O dispositivo apenas reconhece algo que já havia sido declarado inconstitucional  pelo Supremo Tribunal Federal. Na prática, as empresas que encontram-se na  sistemática cumulativa do PIS/Cofins não precisam ingressar em juízo para  excluir receitas não operacionais. 
De acordo com o consultor tributário do  escritório Cabanellos Schuh Advogados Associados Rafael Nichele, considerando  que o conceito de receita não operacional resta ainda indefinido pelo STF, o  contribuinte deve tomar cautela na adoção dessa exclusão, pois ele varia de  acordo com a atividade fim da empresa. 
Outro ponto destacado por Nichele  trata sobre a redução de multas das contribuições previdenciárias que podem ter  efeito retroativo. A nova legislação trouxe outra importante modificação. Ela  diz respeito às multas referentes aos erros ou omissões nas Guias de  Recolhimento da Previdência Social ou FGTS. Antes da lei, essas multas poderiam  chegar a 100% do valor do tributo devido. Agora, cada grupo de dez informações  equivocadas gera um débito de R$ 20,00. "O mais relevante é que o contribuinte  com débitos dessa natureza poderá sustentar perante o Poder Judiciário que essa  modificação tem efeito retroativo para recalcular todo o valor",  destaca.
Confira as regras gerais
- O prazo para opção se  estende até o último dia útil do sexto mês subsequente ao da publicação da  lei.
- Em até 60 dias da publicação da Lei 11.941/2009, a RFB e PGFN editarão  os atos necessários para a adesão do parcelamento.
- Os débitos serão  incluídos no novo parcelamento de acordo com a manifestação do contribuinte  optante.
- A atualização monetária do débito consolidado será efetuada por  meio da taxa Selic.
- Não será exigida garantia nem arrolamento de bens.
-  A manutenção em aberto de três parcelas implicará a rescisão do  parcelamento.
RTT é obrigatório a partir de 2010
A  Lei 11.941/09 instituiu o Regime Tributário de Transição (RTT), criado para  neutralizar os efeitos tributários e remover a insegurança jurídica surgida após  a aprovação da Lei 11.638/07, que harmoniza as normas nacionais de contabilidade  às internacionais. O Regime Tributário de Transição deve respeitar o princípio  da neutralidade, diz o sócio da BDO Trevisan Lúcio Abrahão. A adoção do RTT é  opcional para o exercício 2008 e 2009 e obrigatório para 2010. 
O importante,  alerta Abrahão, é que a opção se dará por meio da DIPJ. "Quando entregar a  declaração, manifestará a opção ou não pelo RTT, optando ou não pelo princípio  da neutralidade." Como a Receita Federal ainda não disponibilizou o programa  para a DIPJ, o que normalmente ocorria em maio, a expectativa é de que até o  final deste mês possa ser acessado, com data limite de entrega até 31 de julho.  
Outra alteração importante na parte contábil traz reflexos à parte fiscal e  estabelece a vedação da compensação das empresas optantes pelo lucro real. Quem  estava nesse regime fazia antecipações durante todo o ano-calendário. O artigo  29 da MP 449 veda a forma de quitação dessas antecipações, restando ao  contribuinte efetuar tais pagamentos por meio de Darf, em dinheiro,  independentemente de ter crédito. Conforme Abrahão, esse foi um baque para  empresários de alguns setores, como exportadoras e outras empresas que serão  atingidos em seu fluxo de caixa. "Alguns contribuintes ingressaram na Justiça  contra a medida, obtendo duas decisões favoráveis", esclarece.  
Evento discutirá temas tributários
O VIII Congresso de  Direito Tributário em Questão discute a partir de amanhã, dia 25, até o próximo  domingo no Hotel Serrano em Gramado a dinâmica tributária nacional e a solução  dos seus principais problemas, tanto no setor público quanto no privado. O  evento, promovido pela Fundação Escola Superior de Direito Tributário (Fesdt), é  considerado o maior do segmento no País. No ano passado, mais de mil pessoas  participaram do encontro. 
O Congresso terá a participação de advogados,  procuradores, juízes, fiscais da Receita e profissionais de outras áreas, com  especialistas que debaterão a Reforma Tributária, Regime Tributário de  Transição, PIS/Cofins, tributação municipal sobre serviços, ICMS e outros  assuntos. "O público carece de debates técnicos sobre os temas tributários de  relevância para o desenvolvimento econômico", diz o vice-presidente da Fesdt  Fábio Canazaro. Serão anunciados também os vencedores do concurso de  monografias, que teve como objetivo estimular a pesquisa no âmbito tributário e  contribuir para o desenvolvimento do assunto. 
Entre os participantes,  falarão no evento o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Lucena  Adams, a secretária da Receita Federal do Brasil Lina Vieira e o gerente de  Políticas Públicas do Sebrae Nacional Bruno Quick. A programação completa do  evento, com datas, horários e temas das palestras pode ser conferida no site  www.fesdt.org.br.
 
                            